quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Ironia da paixão - Parte II




No seguimento de Ironia da paixão - Parte I...

(...)
De imediato tirou um lenço da carteira e começou a limpar o sangue que cobria a cara do pobre homem enquanto se desfazia em mil desculpas. O homem moribundo sorria e dizia: - "Não se preocupe menina, estas coisas acontecem..."
Com as mãos trêmulas tirou o telemóvel da carteira, chamou uma ambulância e ficou ali sentada no chão com a sua cabeça no colo enquanto a ajuda não chegava. Ficaram ali quietos sem falar. Trocaram olhares de esguelha como duas crianças envergonhadas. Dois estranhos no meio da rua, no meio das pessoas, dos  carros e dos prédios. Dois estranhos numa cidade que por momentos não tinha ninguém, apenas eles. Dois estranhos unidos pela ironia do desamor. Dois estranhos unidos pelo ódio, pela traição e pelo infortúnio.
A ambulância chegou. De imediato o homem foi colocado sobre a maca, imobilizado e estabilizado. Não corria perigo. Quando iam coloca-lo dentro da ambulância aproximou-se dele e colocou-lhe um pequeno papel na mão e sussurrou-lhe ao ouvido - "Liga-me".
Ele sorriu e fechou a mão. Enquanto o colocavam na ambulância respondeu - "Descansa, em breve terás noticias minhas". As portas fecharam-se e em poucos segundos a ambulância desapareceu por entre as ruas, as pessoas, os carros, os prédios.

Dias passaram sem que ouvisse falar nele. Uma semana depois e já prestes a perder a esperança de o voltar a encontrar, ao abrir a caixa de correio pela manhã lá estavam as tão esperadas notícias. Sentiu uma alegria indescritível apoderar-se de si, uma sensação de frescura percorrer o seu corpo como não sentia há muito tempo. Uma vontade insana de saltar para o meio da rua e dançar como se das árvores emanasse música. Correu para dentro de casa e com as mãos a tremer abriu a carta.
O sorriso deu lugar a lágrimas.

A carta era dele sim, mas era uma intimação para comparecer em tribunal...


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